Poema

Comi meu pão de côdea já dura

 António Silva

Junho de 2024

Foto/Pinterest

Eu já comi meu pão de côdea dura

Que minhas mãos amassaram

Quando me despedi

Deixando meu trigo novo na eira,

E naquele velho portão

Um portão pintado de verde

Mesmo sendo o verde a cor da esperança

Eu parti e não regressei,

Eu substitui os sonhos, por um lenço de cambraia

Não tinha o perfume da maresia

E eu lavei meu rosto em água de rosas,

Nas tardes quando do céu chorava

O rio, a sua longa corrida continuava

Em direção ao oceano velho e traiçoeiro,

E nas manhãs de sereno nevoeiro

Eu ia colhendo violetas

Para secar no meu livro de história

Em gestos que o mundo perdeu

Quando a dor amanhecia sozinha,

E a noite caía devagarinho

Quando o sol decidia partir, mesmo sozinho

E eu decidi partir sob as brumas que me protegiam

Das sombras do vento

Quando roubei as asas de condor

E voei para um lugar onde poderia finalmente descansar,

Tornei-me como uma estatua cinzelada

Por um cinzel feito de nada

Nos dias em que o eu ficava sentado

Nas sombras da solidão,

Mas nas ruas perdidas

Nos atalhos da vida, eu ausentei-me de mim

Fiz um pouco de tudo e não fui nada,

Mas encerrei e guardei em meus braços

As folhas escritas dos versos, que eu ia escrevendo

Nos tragos da vida que eu bebi sem esperar

Entre os silêncios que foram quebrados

Pelos ruídos dos meus passos nas pedras da calçada,

Nos caminhos da primavera, ladeados por fetos

E velhos sobreiros retrocidos, já sem idade

Num silêncio onde a mágoa fez habitação

E eu já comi a côdea dura do meu pão.

Que por mim foi amassado.

António Silva

Junho de 2024

António Silva

António Silva

Poeta

Eu me chamo António Silva. Sou português e da província do Baixo Alentejo. Gosto muito de pintar e escrever poesia.

Meus poemas são pequenas pinturas coloridas. Cada tela que pinto é um poema colorido. E meus poemas são pinturas que retratam pedaços da minha vida. Recordações de infância que ficaram gravadas em meu coração. Eu gosto de colorir a vida com meus poemas e minhas pinturas. Assim a vida é mais fácil e mais bonita. Pinto e escrevo, como se ainda eu fosse uma criança.

Pois por dentro, eu não mudei, sou uma criança que tem um corpo de adulto.

Palavras que o tempo tinha escondido

Guardo en min a tua primavera

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