Há tradições que a nossa gente nunca esquece. Estão, geralmente, associadas a festividades religiosas ou profanas.

Hoje, vou falar-vos da maior de todas e a mais delicada, porque nos envolve em sentimentos de amor e saudade. Amor, porque é a Festa da Família; Saudade, porque recordamos os que amamos e já não vemos sentados à mesa, na ceia que preparamos com desvelo, ou porque abalaram para outras terras, em busca de uma vida melhor, ou porque partiram para o Além, de onde nunca mais voltarão.

Está prestes a noite mais longa do ano, a noite em que as ruas das cidades e aldeias ficam desertas, porque todos já estão reunidos em ambiente familiar para festejarem, com amor, o Natal.

É uma festa profundamente Cristã, porque se celebra o nascimento do Menino mais desejado, o Salvador do Mundo, o Jesus de Nazaré.

Mas a verdade é que, nem só os Cristãos estão unidos nessa festividade. Muitos não crentes, mas que acreditam no Amor, a celebram, também.

Com bastante antecedência, as igrejas, as ruas, os centros comerciais, as pequenas lojas, as nossas casas e até as árvores das grandes avenidas se enfeitam com luzes das mais diversas cores e de formas sugestivas: pinheirinhos, anjos, estrelas, sinos, azevinho, estando sempre em grande destaque o presépio, a humilde cabana onde nasceu Jesus, aquecido pelo bafo da vaquinha e do jumento, que os tinha levado a Belém.

Niña

São representações com grande simbolismo na nossa cultura e continuam encantando as crianças, pela magia que as envolve, associadas a tantas músicas tradicionais que transbordam esse espírito sentimental, quase inexplicável, mas que é o reflexo do amor que desejamos ver pairar em todas as famílias deste mundo, por vezes tão conturbado e desumano, no sonho de derrubarmos todas as barreiras, para que não haja qualquer tipo de discriminação.

A esta época Natalícia, poucos ficam indiferentes, havendo mais manifestações de solidariedade, abrindo-se as portas, com carinho, aos marginalizados, aos sem-abrigo, aos idosos, às crianças abandonadas e aos mais pobres.

Quantas vezes pensamos, que “Natal” deve ser todos os dias, porque, afinal, a partilha de amor e a fraternidade são intemporais.

Porém, a realidade por vezes, é dura e mostra-nos as desigualdades sociais existentes aqui e noutros pontos do planeta.

Em contradição, nos países onde a riqueza abunda, nesta ocasião Natalícia, o consumo de bens aumenta, porque a publicidade incentiva a comprar, para além do essencial.

Com essa atitude, procuramos, muitas vezes, manifestar o amor que sentimos uns pelos outros, de uma forma palpável, oferecendo prendinhas embrulhadas em lindos papéis coloridos e brilhantes, sinal da alegria que nos envolve o coração.

Nesta altura do ano, a maioria das famílias já tem a sua sala enfeitada com um pinheirinho, elemento de tradição nórdica, mas  que se tornou habitual entre nós, coberto de fitas, laços multicolores, bolas de todas as cores, luzes que piscam, nunca esquecendo, na sua base, a cabaninha do presépio com a Sagrada Família: S. José, apoiado no seu cajado, a Virgem Maria, ajoelhada, frente ao simples berço, onde o seu Menino, deitado sobre as palhinhas, de braços abertos, nos quer abraçar e, na rectaguarda, lá estão a vaquinha e o burrinho, aquecendo com o seu bafo, o lindo nascituro.

Há ainda quem complete a cena com os pastores e os seus rebanhos, as lavadeiras e mais ao longe, os três Reis Magos, vindos do Oriente, guiados por uma estrela, até à Lapinha de Belém, onde chegaram, dias mais tarde, fugindo à maldade de Herodes.

Tudo isto encanta as crianças e o conhecimento da vida de Jesus poderá incutir no seu espírito, sentimentos de solidariedade e fraternidade.

Se vos contar como era festejado o Natal no meu tempo de criança, há 70 anos, numa pequena Aldeia do interior do Alentejo, poderão entender quantas diferenças, hoje existem. Mas, também vos posso afirmar que, apesar de tudo, éramos tão felizes, como se tivéssemos o mundo nas nossas mãos.

Vivia-se com muito pouco. Eram tempos de muita pobreza. As famílias eram numerosas e para que os filhos não passassem fome, pudessem andar vestidos e calçados, muito sofriam, os mais velhos.

Por isso mesmo, as prendinhas que esperávamos no sapatinho, colocado na chaminé, na noite de Natal, eram recebidas com tanta alegria, como se fossem um verdadeiro tesouro. Bastavam-nos uns pequeninos chocolatinhos, envoltos em papel de prata colorida e ficávamos radiantes.

Era hábito, mesmo nas casas dos pobres, na noite de Natal, fazerem-se os “fritos”. Farinha de trigo, amassada com banha de porco e sumo de laranja. A massa era tendida em pequenos pedaços, com um rolo de madeira e depois recortada com uma cartilha, sobre uma tábua larga que a minha Mãe colocava no colo, sentadinha numa cadeira baixinha, junto à lareira acesa na chaminé, e o meu Pai encarregava-se de fritar as filhós numa sertã, bem cheia de azeite puro, virando-as para ficarem loirinhas e estaladiças.

Eram depois colocadas num grande alguidar de barro e polvilhadas com açúcar e canela. Uma verdadeira delícia.

Porém, o que não podia faltar, na noite de Natal, eram as azevias. A massa era parecida à das filhoses, mas havia um recheio muito especial para colocar dentro delas. Talvez um doce único, feito com grão-de-bico bem cozido e libertado das películas, esmagado com um passe-vite, misturado com açúcar, levado a lume brando e no final misturavam-se umas gemas de ovos e raspa de limão. Doce nutritivo e saudável que nos dava um prazer enorme comer, mesmo durante os dias que se seguiam à Festa de Natal.

Como refeição, nessa noite tão bonita, comíamos arroz de bacalhau e no dia de Natal, havia o frango frito, bem temperado e muito saboroso.

Não poderei deixar de vos contar que, durante a noite festiva, na minha Aldeia, havia sempre uns cantadores que se dispunham a andar de porta em porta, envoltos nos seus capotes com belas golas de raposas, para se protegerem do frio, que nessa altura é de enregelar, tocando as roncas e cantando ao Deus Menino.

Tradições que se mantêm vivas, ainda, e que são apreciadas por muita gente, além- fronteiras.

À meia-noite do dia 24 de dezembro, ninguém faltava à Missa do Galo, na Igreja paroquial. Muitas regiões de Portugal continuam praticando este ritual religioso.

É assim chamada essa celebração, porque uma lenda muito antiga, contada nos países latinos, revela que à meia-noite, do dia 24 de dezembro, um galo cantou, como nunca se ouvira outro animal da mesma espécie cantar, anunciando a vinda do Messias, o filho de Deus vivo, Jesus Cristo.

Lendas ou histórias reais dão mais vida, aos dias que vivemos. Assim, para terminar, aqui vos deixo um tradicional conto de Natal, que podereis ler aos vossos filhos e, certamente, eles ficarão encantados com a sua singeleza, desejando-vos um Feliz Natal, com muita paz e saúde.

Pela noite de Natal

Pela noite de Natal, noite de tanta alegria, caminhando vai José, caminhando vai Maria.

Vão os dois para Belém, mais de noite que de dia e chegaram a Belém, já toda a gente dormia.

– Abri a porta, porteiro, porteiro da portaria!

Não deu resposta o porteiro, porque também já dormia.

Buscou lenha S. José, porque a noite estava fria e deixou ao desamparo, sozinha, a Virgem Maria.

Quando voltou S. José, já viu a Virgem Maria com um sorriso nos lábios, enquanto Jesus dormia.

Vêm os Anjos dos céus, a cantar Avé Maria!

Hoje mesmo, em Belém, nasceu Jesus de Maria!

Graça Foles Amiguinho

Graça Foles Amiguinho

Colaboradora Portuguesa

“Son Maria de Graça Foles Amiguinho Barros. Vivo en Vila nova de Gaia, pero nascín no Alentejo, nunha aldeia pequena chamada A Flor do Alto Alentejo.

Estudei en Elva. Fiz maxisterio en Portoalegre. Minha vida foi adicada ao ensino durante 32 anos, aos meus alumnos ensineilles a amar as letras, o país, as artes e a cultura. 

Meu começo coa poesia aconteceu de xeito dramático cando partin os dous braços, en 2004 comecei a escribir poesia compulsivamente, en 2005 xa tiña o primero libro editado  O meu sentir…”

A “ronca” e os cantares ao Menino

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